sábado, 28 de janeiro de 2012

O retorno de Inanna


Finalizando o Ciclo de Inana, uma outra versão do Retorno, boa leitura!





Um lamento fez-se ouvir na cidade:
- Minha senhora chora amargamente pelo seu jovem esposo
Inana chora amargamente por seu jovem esposo.
Ela está cheia de pesar por seu esposo! Ela está cheia de pesar por seu jovem amado!
Ela está cheia de pesar pelo palácio! Ela está cheia de pesar pela cidade!
 
Dumuzi foi levado cativo de Uruk
Ele não mais vai se banhar em Eridu
Ele não mais irá se lavar no altar sagrado
Ele não mais irá tratar a mãe de Inana como se fosse sua mãe
Ele não mais irá cumprir seus doces deveres
Entre as donzelas da cidade.
 
Ele não mais irá competir com os jovens da cidade
Ele não mais irá erguer sua espada mais alto do que os altos sacerdotes
Grande é o pesar daqueles que choram por Dumuzi!
 
Inana chora por Dumuzi:
- Foi-se o meu esposo, meu doce esposo,
Foi-se o meu amor, o meu doce amor.
Meu amado foi levado da cidade.
Oh, moscas das estepes,
Meu adorado noivo foi tirado de mim
Antes que eu pudesse envolvê-lo numa mortalha adequada.
 
O touro selvagem não mais vive,
O pastor, o touro selvagem não vive mais
Dumuzi, o touro selvagem, não vive mais.
 
Eu pergunto às colinas e vales:
Onde está meu esposo?
Eu digo a eles:
Não mais posso servir-lhe alimentos,
Não mais posso servir-lhe bebidas.
 
O chacal se deita no leito que era dele
O corvo mora entre seu rebanho
Você me pergunta a respeito da sua flauta de junco de Dumuzi?
O vento toca por ele.
Você me pergunta sobre as doces canções de Dumuzi?
O vento deve cantá-las por ele.
 
Sirtur, a mãe de Dumuzi, chora por seu filho:
- Meu coração toca a flauta de junco da saudade (do luto)
Outrora meu menino andava livre pelas estepes,
Agora ele está cativo
Outrora Dumuzi andava tão livre pelas estepes
Agora ele está preso
 
[Como] a ovelha-mãe desiste de seu filhote
[Como] a cabra desiste de seu rebento
Meu coração toca a flauta de junco da saudade.
 
Oh, estepe traiçoeira!
No lugar onde ele disse uma vez:
'Minha mãe irá pedir por mim'
Agora ele não mais pode mover suas mãos
Ele não mais pode mover seus pés.
Meu coração toca a flauta de junco da saudade,
Eu irei até ele,
Eu irei até meu filho.
 
A mãe de Dumuzi caminhou para o local desolado
Sirtur andou até o lugar onde Dumuzi se deitava
Ela disse:
- Oh, meu filho, vejo tua face, mas teu espírito não está mais aqui!
 
Há luto na casa
Há profundo pesar nos aposentos internos.
 
A irmã de Dumuzi também vagueava pela cidade, chorando por seu irmão.
Geshtinana vagueava pela cidade, chorando por Dumuzi.
- Oh, meu irmão! Quem é tua irmã?
Eu sou tua irmã.
Oh, meu irmão! Quem é tua mãe?
Eu sou tua mãe.
O dia que amanhece para ti, também amanhece para mim.
O dia que você vê, eu também o verei.
Eu vou encontrar meu irmão! Eu irei consolá-lo!
Eu vou compartilhar seu destino com ele!
 
Quando ela viu o pesar da irmã
Quando Inana viu o pesar de Geshtinana,
Inana falou a ela gentilmente?
- A casa do seu irmão não mais existe
Dumuzi foi levado pelos gala
Eu te levaria até ele
Mas não sei onde ele está.
 
Então uma mosca apareceu.
A mosca sagrada voou acima da cabeça de Inana e falou:
- Se eu vos disser onde está Dumuzi, o que ireis me dar?
 
Inana disse:
- Se você me disser,
Deixarei você freqüentar as cervejarias e tavernas
Deixarei você viver entre as conversas dos sábios
Deixarei você viver entre as canções dos menestréis.
 
A mosca falou:
- Erguei vossos olhos para os confins das estepes
Erguei vossos olhos para Arali
Lá vós encontrareis o irmão de Geshtinana
Lá vós encontrareis o pastor Dumuzi.
 
Inana e Geshtinana foram até os confins das estepes
Lá encontraram Dumuzi chorando
Inana então tomou a mão de Dumuzi e disse:
 
 - Irás para o Mundo Subterrâneo por meio ano
Tua irmã, uma vez que foi seu desejo, irá para lá pela outra metade.
No dia em que fores chamado, naquele dia serás levado
No dia em que Geshtinana for chamada, neste dia serás posto em liberdade.
 
Inana coloca as mãos de Dumuzi e Geshtinana nas mãos de Ereshkigal, a Eterna.
 Sagrada Ereshkigal! Graças vos sejam dadas!
Sagrada Ereshkigal! A vós eu canto!

O Sonho de Dumuzi

Continuando com o Ciclo de Inana, o próximo texto conta a história de um sonho que Dumuzi teve, vamos conferir?



Seu coração estava cheio de lágrimas 
O coração do pastor estava cheio de lágrimas 
O coração de Dumuzi estava cheio de lágrimas 
Dumuzi cambaleava pelas estepes, chorando: 
- Oh, estepe, comece um lamento por mim! 
Oh, caranguejos do rio, fiquem de luto por mim! 
Oh, sapos do rio, chamem por mim! 
Oh, minha mãe, Sirtur, chora por mim! 
  
Se ela não encontrar os cinco pães, 
Se ela não encontrar os dez pães, 
Se ela não souber do dia da minha morte, 
Você, oh estepe, dirá a ela, dirá à minha mãe. 
Na estepe, minha mãe derramará lágrimas por mim 
Na estepe, minha mãe irá ficar de luto por mim. 
  
Ele se deitou para descansar 
O pastor se deitou para descansar 
Dumuzi deitou-se para descansar. 
Quando ele se deitou entre os botões e arbustos 
Ele teve um sonho 
Ele acordou por causa do sonho 
Ele tremeu frente à visão do sonho 
Ele esfregou os olhos, aterrorizado. 
  
Dumuzi chamou: 
- Tragam... tragam-na.... tragam minha irmã 
Tragam minha Geshtinana, minha irmãzinha 
Minha escriba que tudo sabe 
Minha cantora de muitas canções 
Minha irmã que conhece o significado das palavras 
A jovem e sábia mulher que conhece o significado dos sonhos 
Devo falar com ela. 
Devo contar-lhe meu sonho. 
  
Dumuzi falou a Geshtinana, dizendo: 
- Um sonho! Minha irmã, ouça o meu sonho: 
Galhos se levantam ao meu redor; galhos crescem espessos ao meu redor 
Um único junco que cresce treme por mim 
Os juncos são removidos, primeiro um, depois o outro, 
Eles que cresciam juntos 
No bosque, o terror das árvores mais altas levantou-se contra mim 
Água começou a se derramar da minha lareira sagrada 
O fundo dos meus baldes [de leite] caiu 
Minha taça caiu de seu lugar costumeiro 
Meu bastão de pastor desapareceu 
Uma águia pega uma ovelhinha do rebanho 
Um falcão pega um papagaio sobe a cerca de juncos 
  
Minha irmã, tuas cabras jogam suas barbas de lápis na poeira 
Tuas ovelhas arranham a terra com suas patas dobradas 
  
Os baldes de leite estão silenciosos, 
Nenhum leite é derramado neles 
A taça está quebrada; Dumuzi não mais existe 
Os rebanhos são dados aos ventos. 
  
Geshtinana falou: 
- Dumuzi, não me contes teu sonho 
Dumuzi, não me fale de tal sonho. 
  
Os galhos que se erguem ao teu redor, 
Os galhos que crescem ao teu redor, 
São teus demônios, que irão te perseguir e te atacar 
  
O junco que cresce solitário e que treme por ti 
É nossa mãe: ela irá lamentar por você 
  
Os juncos duplos, que são removidos um depois do outro, 
São tu e eu: primeiro um será levado, depois o outro. 
  
No bosque, o terror das árvores altas que se ergue contra ti 
São os galla: eles descerão sobre os rebanhos. 
  
Quando o fogo for apagado da tua lareira sagrada, 
Os rebanhos tornar-se-ão a casa da desolação 
  
Quando o fundo de teus baldes de leite se soltar 
Serás preso pelos galla 
  
Quando tua taça cair do lugar de costume 
Irás cair na terra, nos joelhos de tua mãe 
  
Quando teu bastão de pastor desaparecer 
Os galla farão tudo fenecer 
  
A águia que pega uma ovelha do rebanho, 
São os galla que irão tocar tua face 
  
O falcão que pega um papagaio sobre a cerca de juncos 
São os gala que subirão a cerca para te levar 
  
Dumuzi, minhas cabras irão arrastar suas barbas de 
lápis na poeira 
  
Meus cabelos erguer-se-ão até os céus por ti 
Minhas ovelhas irão arranhar a terra com as patas dobradas 
Oh, Dumuzi, farei os sinais de luto na face por ti! 
  
Os baldes de leite estão silenciosos; nenhum leite é servido 
A taça está em estilhaços; Dumuzi não existe mais 
Os rebanhos são dados aos ventos.... 
  
Mal havia Geshtinana falado tais palavras, 
Quando Dumuzi gritou: 
- Minha irmã! Rápido, suba à colina! 
Não vá até lá com passos vagarosos e nobres! 
Irmã, corra! 
Os galla, odiados e temidos pelos homens, 
Estão chegando em barcos 
Eles trazem madeira para atar minhas mãos 
Eles trazem madeira para prender meu pescoço 
Irmã, corra! 
  Geshtinana subiu a colina. 
O amigo de Dumuzi subiu com ela. 
Dumuzi perguntou: 
- Você consegue vê-los? 
O amigo respondeu: 
- Eles estão vindo: 
Os grandes galla que carregam madeira para atar o pescoço 
Eles estão vindo para pegar você. 
Geshtinana urgiu: 
- Rápido, irmão! Esconde tua cabeça na grama. 
Teus demônios estão vindo! 
  
Dumuzi disse: 
- Minha irmã, não diga a ninguém do meu esconderijo, 
Meu amigo, não diga a ninguém do meu esconderijo 
Vou me esconder na grama 
Vou me esconder entre as pequenas plantas 
Vou me esconder entre as grandes plantas 
Vou me esconder nos fossos de Arali. 
  
Geshtinana e o amigo de Dumuzi responderam: 
Dumuzi, se dissermos teu esconderijo, 
Que os cães nos devorem, 
Os cães pretos do pastoreio 
Os cães pretos da realeza 
Que eles nos devorem! 
Os pequenos galla falaram para os grandes galla: 
- Vocês, galla, que não têm mãe, ou pai 
Que não têm irmão, esposa ou filhos 
Vocês, que voam pelos céus e a terra como guardiões 
Que não concedem favores 
Que não conhecem o bem ou o mal 
Digam-nos 
Quem já viu a alma de um homem amedrontado viver em paz? 
Não vamos procurar por Dumuzi na casa de seu amigo 
Não vamos procurar por Dumuzi na casa de seu cunhado 
Vamos procurar por Dumuzi na casa de sua irmã, Geshtinana. 
  
Os galla bateram palmas alegremente 
Eles foram procurar por Dumuzi 
Eles foram até a casa de Geshtinana. Eles gritaram: 
- Mostre-nos onde está teu irmão! 
  
Geshtinana nada disse. 
  
Eles lhe ofereceram o Dom das águas 
Ela recusou 
Eles lhe ofereceram o Dom dos cereais 
Ela recusou 
  
O céu se aproximou 
A terra se aproximou 
Geshtinana nada falou 
  
Eles rasgaram as roupas de Geshtinana 
Eles derramaram piche na vulva dela 
Geshtinana nada falou. 
Os pequenos galla disseram para os grandes galla: 
- Quem, desde o princípio dos tempos, 
Soube de uma irmã que revelasse o esconderijo de seu irmão? 
Venham, vamos procurar por Dumuzi na casa de seu amigo. 
  
Os galla foram à casa do amigo de Dumuzi. 
Eles lhe ofereceram o Dom das águas 
Ele aceitou 
Eles lhe ofereceram o Dom dos cereais 
Ele aceitou. 
Ele disse: 
- Dumuzi escondeu-se na grama, 
Mas não sei onde ele se encontra. 
  
Os galla procuraram por Dumuzi na grama 
Mas não o encontraram. 
O amigo disse: 
- Dumuzi escondeu-se entre as plantas grandes, 
Mas não sei onde ele se encontra. 
  
Os galla procuraram por Dumuzi entre as plantas grandes 
Mas não o encontraram. 
O amigo disse: 
- Dumuzi escondeu-se nos fossos de Arali, 
Dumuzi caiu nos fossos de Arali. 
  
Nos fossos de Arali, os galla pegaram Dumuzi 
Dumuzi empalideceu e chorou 
Ele gritou: 
- Minha irmã salvou minha vida 
Meu amigo causou minha morte 
Se o filho de minha irmã vaguear pelas ruas 
Que a criança seja protegida 
Que esta criança seja abençoada 
Se o filho de meu amigo vaguear pelas ruas 
Que esta criança se perca 
Que tal criança seja amaldiçoada. 
  
Os galla rodearam Dumuzi 
Eles ataram suas mãos, eles ataram seu pescoço 
Eles bateram no esposo de Inana 
Dumuzi ergueu seus braços para o céu, para Utu, 
O deus Sol, o deus da Justiça, bradando: 
- Oh, Utu, tu és meu cunhado 
Sou o esposo de tua irmã 
Sou aquele que carregou alimentos até o altar sagrado 
Sou aquele que trouxe presentes de núpcias a Uruk 
Eu beijei os lábios sagrados 
Eu dancei sobre os joelhos sagrados, os joelhos de Inana 
  
Transforme minhas mãos nas patas de uma gazela 
Transforme meus pés nas patas de uma gazela 
Deixe-me escapar de meus demônios 
Deixe-me fugir para Kubiresh! 
  
O misericordioso Utu aceitou as lágrimas de Dumuzi 
Ele transformou as mãos de Dumuzi nas patas de uma gazela 
Ele transformou os pés de Dumuzi nas patas de uma gazela 
Dumuzi escapou de seus demônios 
Ele fugiu para Kubiresh. 
  
Os galla disseram: 
- Vamos a Kubiresh! 
  
Os galla chegaram a Kubiresh 
Dumuzi escapou de seus demônios 
Ele fugiu para [onde estava] a Velha Belili 
  
Os galla disseram: 
- Vamos até a Velha Belili! 
  
Dumuzi entrou na casa da Velha Belili. Ele disse a ela: 
- Velha senhora, eu não sou um mero mortal 
Sou o esposo da deusa Inana 
Sirva água para eu beber 
Prepare a farinha para eu comer. 
  
Após a anciã Ter servido a água 
E haver preparado a farinha para Dumuzi 
Ela deixou a casa. 
  
Quando os galla viram-na partir, eles entraram na casa 
Dumuzi escapou de seus demônios 
Ele fugiu para onde estava o rebanho de sua irmã Geshtinana 
  
Quando Geshtinana encontrou Dumuzi entre o rebanho, ela chorou 
Ela abriu sua boca e gritou tão alto quanto os céus 
Ela trouxe a sua boca o mais próximo da terra 
Sua dor cobriu o horizonte tal qual uma veste 
  
Ela fez os sinais de luto nos olhos 
Ela fez os sinais de luto na boca 
Ela fez os sinais de luto nos quadris 
  
Os galla subiram a cerca de juncos 
O primeiro galla bateu na face de Dumuzi com um prego pontudo 
O segundo galla bateu na outra face de Dumuzi 
com o bastão do pastor 
O terceiro galla espatifou o fundo do balde de leite 
O quarto galla arrancou a taça do seu lugar de costume 
O quinto galla destruiu o balde de leite 
O sétimo galla gritou: 
- Levante-se, Dumuzi! 
Esposo de Inana, filho de Sirtur, irmão de Geshtinana, 
Suas cabras foram pegas! Suas ovelhas foram pegas! 
Seus filhotes foram pegos! 
Tire a coroa sagrada de sua cabeça 
Dispa as vestes das Medidas Sagradas de seu corpo 
Que o cetro real caia por sobre a terra! 
Tire as sandálias sagradas dos pés 
Despido, você vem conosco! 
  
Os galla pegaram Dumuzi 
Eles o rodearam 
Eles prenderam suas mãos. Eles prenderam seu pescoço. 
  
Os baldes de leite silenciaram. 
Nenhum leite foi neles derramado 
A taça foi estilhaçada. Dumuzi não existia mais 
Os rebanhos foram dados aos ventos. 



sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Os Abençoados de Inanna


Então, no Ciclo de Inanna, quando Ela subiu da Terra dos Mortos (Também chamado de Inferno - Inferno no sentido de ser um Lugar Inferior, Abaixo, o Submundo), Ela foi ajudada por um ser meio homem e meio mulher. Esta história nos conta a origem sagrada dos homossexuais/bissexuais/transsexuais. O mito diz:



Asushunamir, o primeiro homem-mulher, ur-sal, foi criado/a por Enki para resgatar Inanna da Terra sem Retorno, Kur-Nu-Gia, o inferno. Inanna, rainha do céu, havia dado a Enki, o sábio, grandes presentes como a sabedoria, a justiça, o amor, as mulheres sagradas e os frutos da vinha. E para salva-la da morte, em retribuição, Enki consturiu com suas próprias mãos um/a belo/a homem/mulher chamado/a Asushunamir; ele/a que tem uma face radiante, e uma beleza estupenda, ele/a que se veste com estrelas, macho e fêmea, companheiro/a de Inanna, Asushunamir.
O feitiço de Ereshkigal, a rainha da morte, não podia possuir alguém vestido/a de luz. Alguém que não era nem homem, nem mulher. Ereshikigal então ficou encantada pela beleza de Asushunamir, inclinada a ouvir sua voz, seduzida por sua dança. Ereshkigal então organizou um grande festim em sua honra, o melhor vinho, as melhores carnes, as mais suntuosas frutas. Ela sonhava em levar aquela beleza para sua própria cama, e mantê-la junto de si para sempre na Terra dos Mortos.
Mas Asushunamir foi cuidadoso/a e não tocou no vinho e nem na comida feita pelos servos de Ereshkigal. Quando a rainha dos mortos perguntou porque ele/a não tocava no vinho, Asushunamir perguntou se ele/a poderia provar a água da vida, que era guardada numa jarra. Esta era a água que Enki havia avisado a Asushunamir que quando voltasse para o mundo dos vivos, deveria banhar-se nela, antes de atravessar os Sete Portões de Irkalla. Ereshkigal então ordenou: "Namtar, traga a jarra que contem a água da vida. Eu realizarei o desejo desta charmosa criatura".
Depois, quando Ereshkigal caiu no sono, Asushunamir encontrou Inanna, dormindo, na sua cela de cativa. Ele/a molhou a deusa com um pouco da água da vida, e levou-a em seus braços ainda adormecida e respirando como um bebê.
Ao Inanna atravessar os Sete Portões de Irkalla, acendendo a terra, a beleza brotou novamente no mundo, flores desabrocharam e a terra se cobriu de verde. As pessoas voltaram a cuidar dos campos, fazer vinho e fazer amor, dando banquetes, tudo em honra de Inanna.
Asushunamir, no entanto, não teve tanta sorte. Ereshkigal acordou e o/a encontrou antes de atravessar o Sétimo Portão. E aí, nem sua beleza, charme, dança ou canções puderam evitar que a paixão da deusa da morte se tornasse ódio.
"Tua comida será servida num estábulo, mil vezes", amaldiçoou Ereshkigal, "A água do esgoto será sua bebida. Nas sombras você habitará, desprezado/a e odiado/a pelo seu próprio povo". E pronunciada a maldição, Ereshkigal o/a baniu.
Quando Inanna descobriu sobre a maldição colocada em Asushunamir, ela falou-lhe palavras doces no ouvido: "O poder de Ereskigal é grande. Ninguém ousa desafia-la. Mas eu tenho meios de suavizar sua maldição, como a primavera chega para banir o inverno. Aqueles que são como você, meus Assinnu e Kalum e Kugarru e Kalaturru, amantes dos homens, parentes de minhas mulheres sagradas, serão desconhecido em seus própria casa. Suas famílias mantê-los-ão nas sombras e não lhes deixarão nada. O bêbedo os imitara, e o poderoso encarcerar-los-á. Mas se você se recorda, como você era nascido da luz das estrelas para me conservar, e através de mim a terra, da escuridão e da morte, a seguir eu abrigarei e a todos do seu tipo. Você será minhas crianças favorecidas, e eu far-lhe-ei meus sacerdotes. Eu conceder-lhe-ei o presente da profecia, a sabedoria da terra e a lua e todos que governa, e você afastará a doença de minhas crianças, exatamente como você me salvou das embreagens de Ereshkigal. E você se vestirá com meus vestidos, e dançará em seus pés e cantará com sua garganta. Nenhum homem será capaz de resistir aos seus encantos. Quando os jarros de barro forem trazidos de Irkalla, os leões pularão nos desertos, e você será livrado da maldição de Ereshkigal, a rainha da morte. Você será chamado uma vez mais, Asushunamir, ser vestido na luz. Seu tipo será chamado aqueles cujas as caras são brilhantes, aqueles que vieram renovar a luz, abençoado de Inanna.

No culto, Asushunamir era sempre representado por uma espécie de ator chamado assinnu. Ann Kessler descreve estes atores como personagens que aparecem em uma variedade de fontes da Mesopotâmia, pertencente ao culto de Innana e que distinguiam-se pelo vestido, penteado e apetrechos femininos. Diversamente travesti, um hermafrodita ou eunuco, o "assinnu" é uma figura ambígua de transgressivo ou, talvez, até mesmo de gênero mutável e sexualidade evidente. A palavra "assinnu" tem a mesma origem que o nome do Deus e esta ligada a ideia de ur-sal, homem-mulher, de pessoa que pode se deslocar entre os dois gêneros.

Escrito por Foxx

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

A descida de Inanna

Parte do Ciclo de Inanna que influenciou praticamente todos os mitos sazonais de todo o Oriente e Europa no geral.




Das Grandes Alturas, ela abriu seus ouvidos para as Grandes Profundezas
Das Grandes Alturas, a deusa abriu seus ouvidos para as Grandes Profundezas
Das Grandes Alturas, Inana abriu seus ouvidos para as Grandes Profundezas
 
Minha Senhora abandonou o céu e a terra para descer ao Mundo Subterrâneo
Inana abandonou o céu e a terra para descer ao Mundo Subterrâneo
Ela abandonou sua posição de sagrada sacerdotisa para descer ao Mundo Subterrâneo
 
Em Uruk, ela abandonou seu templo para descer ao Mundo Subterrâneo
Em Babtibira, ela abandonou seu templo para descer ao Mundo Subterrâneo
Em Zabalan, ela abandonou seu templo para descer ao Mundo Subterrâneo
Em Adab, ela abandonou seu templo para descer ao Mundo Subterrâneo
Em Nippur, ela abandonou seu templo para descer ao Mundo Subterrâneo
Em Kish, ela abandonou seu templo para descer ao Mundo Subterrâneo
Em Akkad, ela abandonou seu templo para descer ao Mundo Subterrâneo
 
Ela reuniu as Sete Medidas Sagradas
Elas tomou as Medidas Sagrada em suas mãos
De posse dos me, ela começou a se preparar
 
Ela colocou a shugurra, a coroa das estepes em sua cabeça,
Ela ajeitou os escuros cachos de cabelo na testa
Ela colocou as pequenas contas de lápis lazuli ao redor de seu pescoço
Ela deixou a fileira dupla de contas tocar seus seios
E colocou as vestimentas reais sobre seu corpo.
Ela pintou seus olhos com pintura chamada "Que ele venha, que ele venha!"
Ela apertou junto ao peito o corpete chamado "Vem, homem, vem!"
Ela colocou a pulseira de ouro ao redor de seu pulso
E tomou em sua mão a linha e o bastão das medidas.
 
Inana partiu para o Mundo Subterrâneo
Ninshubur, sua fiel serva, foi junto com ela.
Inana falou a Ninshubur, dizendo:
- Ninshubur, meu constante apoio
Minha primeira-ministra que me dá sábios conselhos
Minha guerreira que luta ao lado meu
Estou descendo para o kur, o Mundo Subterrâneo.
Se eu não retornar,
Comece um lamento por mim junto às ruínas
Bata o tambor por mim nos locais de assembléia
Faça um círculo completo ao redor da casa dos deuses
Faça os sinais de luto ao redor dos olhos, da boca, de seus quadris,
Vista-se com apenas uma peça de roupa, tal qual um mendigo
Vá a Nippur, ao templo de Enlil.
Quando chegares no altar sagrado, brade:
"Oh, Pai Enlil, não deixai vossa filha
Ser posta para morrer no Mundo Subterrâneo.
Não deixai vossa prata de maior brilho
Ser coberta com o pó do Mundo Subterrâneo.
Não deixai vosso precioso lápis lazuli
Ser quebrada como pedra para o pedreiro [trabalhar]
Não deixai vossa perfumada caixa de madeira preciosa
Ser partida como madeira para o madeireiro
Não deixai a sagrada sacerdotisa dos céus
Ser posta para morrer no Mundo Subterrâneo.
 
Se Enlil não ajudar,
Vá até Ur, ao templo de Nana.
Chore ante pai Nana.
Se Nana não ajudar,
Vá até Eridu, ao templo de Enki.
Chore ante pai Enki
Pai Enki, o deus da Sabedoria, conhece o alimento da vida,
Ele conhece as águas da vida
Ele conhece os segredos.
Com certeza ele não vai me deixar morrer.
 
Inana continuou sua jornada para o Mundo Subterrâneo
Então [num ponto], ela parou e disse:
- Vá agora, Ninshubur
E não esqueça as palavras que te recomendei.
 
Quando Inana chegou junto aos portais exteriores de Mundo Subterrâneo
Ela bateu com força no primeiro portal
Ela bradou com voz forte:
- Abra a porta, porteiro!
Abra a porta, Neti!
Eu sozinha quero entrar!
 
Neti, o porteiro do Mundo Subterrâneo, perguntou:
- Quem sois vós?
Inana respondeu:
- Sou Inana, Rainha dos Céus,
A caminho do Leste.
 Neti disse:
- Se sois realmente Inana, a Rainha dos Céus,
A caminho do Leste,
O que levou vosso coração a tomar a estrada
Da qual caminhante algum retornou?
Inana respondeu:
- Por causa... por causa de minha irmã, Ereshkigal.
Seu marido, Gugalana, o Touro dos Céus, faleceu.
Eu vim para testemunhas os ritos fúnebres
Que a cerveja de seu funeral seja derramada numa taça
Que isto seja feito.
 Neti falou:
- Permanecei aqui, Inana. Eu falarei com minha senhora, dar-lhe-ei vossa mensagem.
Neti, o porteiro-chefe do Mundo Subterrâneo,
Entrou no palácio de Ereshkigal, a Rainha do Mundo Subterrâneo, e disse:
- Minha Senhora, uma donzela,
Tão alta quanto os céus,
Tão ampla quanto a terra,
Tão forte quanto as fundações das muralhas da cidade
Espera fora dos portais do palácio.
 
Ela traz consigo as sete medidas sagradas
Elas as traz em suas mãos.
De posse dos me, ela se preparou.
 
Na cabeça, ela veste a shugurra, a coroa das estepes
Na testa, seus cachos de cabelos escuros estão cuidadosamente penteados
No pescoço ela traz as pequenas contas de lápis lazuli
Sobre seus seios caem as duas correntes de contas
Seu corpo está vestido com as vestimentas reais
Seus olhos estão pintados com maquiagem chamada "Que ele venha, que ele venha!"
Junto ao peito ela traz o corpete chamado "Vem, homem, vem!"
No pulso ela traz a pulseira de ouro
E em sua mão ela traz a linha e o bastão das medidas.
 
Quando Ereshkigal, a Rainha do Mundo Subterrâneo, ouviu tal relato
Ela bateu sua poderosa mão na coxa e mordeu o lábio inferior
Ela considerou cuidadosamente os fatos, e então falou:
- Neti, meu porteiro-chefe do Mundo Subterrâneo,
Preste bem atenção às minhas palavras
Feche os sete portais do Mundo Subterrâneo
Então, um por um, abra um pouco cada portal,
Deixe Inana entrar
Quando ela entrar, remova suas vestes reais
Deixe a alta sacerdotisa dos céus entrar aqui sem qualquer resquíscio de seu poder.
 
Neiti prestou atenção às palavras de sua rainha.
Ele fechou as sete portas do Mundo Subterrâneo,
E então abriu o portal exterior (de cada uma)
Ele disse para a donzela:
- Vinde, Inana, entrai.
 
Quando ela entrou pelo primeiro portal,
Foi removida de sua cabeça a shugurra, a coroa da estepe.
Inana perguntou:
- O que é isto?
Foi-lhe dito:
- Silenciai-vos, Inana, os desígnios do Mundo Subterrâneo são perfeitos.
Eles não podem ser questionados.
Quando ela entrou pelo segundo portal,
Foram removidas de seu pescoço as contas de lápis lazuli.
Inana perguntou:
- O que é isto?
Foi-lhe dito:
- Silenciai-vos, Inana, os desígnios do Mundo Subterrâneo são perfeitos.
Eles não podem ser questionados.
Quando ela entrou pelo terceiro portal,
Foram removidas de seu peito as correntes duplas de contas..
Inana perguntou:
- O que é isto?
Foi-lhe dito:
- Silenciai-vos, Inana, os desígnios do Mundo Subterrâneo são perfeitos.
Eles não podem ser questionados.
Quando ela entrou pelo quarto portal,
Foi retirado de seu peito o corpete chamado "Vem, homem, vem!".
Inana perguntou:
- O que é isto?
Foi-lhe dito:
- Silenciai-vos, Inana, os desígnios do Mundo Subterrâneo são perfeitos.
Eles não podem ser questionados.
Quando ela entrou pelo quinto portal,
Foi retirada de seu pulso a pulseira de outro.
Inana perguntou:
- O que é isto?
Foi-lhe dito:
- Silenciai-vos, Inana, os desígnios do Mundo Subterrâneo são perfeitos.
Eles não podem ser questionados.
Quando ela entrou pelo sexto portal,
Foi-lhe retirado da mão o bastão e a linha das medidas
Inana perguntou:
- O que é isto?
Foi-lhe dito:
- Silenciai-vos, Inana, os desígnios do Mundo Subterrâneo são perfeitos.
Eles não podem ser questionados.
Quando ela entrou pelo sétimo portal,
Foi-lhe retirado do corpo as suas vestimentas reais.
Inana perguntou:
- O que é isto?
Foi-lhe dito:
- Silenciai-vos, Inana, os desígnios do Mundo Subterrâneo são perfeitos.
 
Nua, e rebaixada, Inana entrou na sala do trono.
Ereshkigal ergueu-se de seu trono
Inana caminhou na direção dela
Os Anunaki do Mundo Subterrâneo cercaram-na
Eles passaram uma sentença contra Inana
 
Então Ereshkigal olhou para Inana com os olhos da morte
Ela falou contra Inana uma palavra de ódio
Ela pronunciou contra Inana um clamor de culpa.
 
Ereshkigal bateu em Inana.
 
Inana foi transformada num cadáver,
Num pedaço de carne apodrecida,
E foi dependurada num gancho da parede.
 Quando, após três dias e três noites, Inana não tinha retornado
Ninshubur começou lamento por ela junto às ruínas
Ela bateu o tambor por ela nos locais de assembléia
Ela fez um círculo completo ao redor da casa dos deuses
Ela fez os sinais de luto ao redor dos olhos, da boca, de seus quadris,
Ela vestiu-se com apenas uma peça de roupa, tal qual um mendigo
Sozinha, ela foi a Nippur, ao templo de Enlil.
 
Quando ela entrou no altar sagrado, Ninshubur bradou:
- Oh, Pai Enlil, não deixai vossa filha
Ser posta para morrer no Mundo Subterrâneo.
Não deixai vossa prata de maior brilho
Ser coberta com o pó do Mundo Subterrâneo.
Não deixai vosso precioso lápis lazuli
Ser quebrada como pedra para o pedreiro [trabalhar]
Não deixai vossa perfumada caixa de madeira preciosa
Ser partida como madeira para o madeireiro
Não deixai a sagrada sacerdotisa dos céus
Ser posta para morrer no Mundo Subterrâneo.
 
Pai Enlil respondeu irado:
Minha filha tinha já as Grandes Alturas
Inana agora queria as Grandes Profundezas
Aquela que recebe as Medidas Sagradas do Mundo Subterrâneo não mais retorna
Aquela que vai à Cidade da Escuridão deve lá permanecer.
 
Pai Enlil não ajudaria Inana..
 
Ninshubur foi a Ur, ao templo de Nana.
Quando ela entrou no altar sagrado, ela bradou:
- Oh, Pai Nana, não deixai vossa filha
Ser posta para morrer no Mundo Subterrâneo.
Não deixai vossa prata de maior brilho
Ser coberta com o pó do Mundo Subterrâneo.
Não deixai vosso precioso lápis lazuli
Ser quebrada como pedra para o pedreiro [trabalhar]
Não deixai vossa perfumada caixa de madeira preciosa
Ser partida como madeira para o madeireiro
Não deixai a sagrada sacerdotisa dos céus
Ser posta para morrer no Mundo Subterrâneo.
 
Pai Nana respondeu irado:
Minha filha tinha já as Grandes Alturas
Inana agora queria as Grandes Profundezas
Aquela que recebe as Medidas Sagradas do Mundo Subterrâneo não mais retorna
Aquela que vai à Cidade da Escuridão deve lá permanecer.
 
Pai Nana não ajudaria Inana..
 
Ninshubur foi a Eridu, ao templo de Enki.
Quando ela entrou no altar sagrado, ela bradou:
- Oh, Pai Enki, não deixai vossa filha
Ser posta para morrer no Mundo Subterrâneo.
Não deixai vossa prata de maior brilho
Ser coberta com o pó do Mundo Subterrâneo.
Não deixai vosso precioso lápis lazuli
Ser quebrada como pedra para o pedreiro [trabalhar]
Não deixai vossa perfumada caixa de madeira preciosa
Ser partida como madeira para o madeireiro
Não deixai a sagrada sacerdotisa dos céus
Ser posta para morrer no Mundo Subterrâneo.
 
Pai Enki disse:
- O que aconteceu?
Que fez minha filha?
Inana! A Rainha de Todas as Terras! A Sagrada Sacerdotisa dos Céus!
O que aconteceu?
Estou preocupado, estou cheio de tristeza.
 
Enki tirou um pouco de sujeira de sua unha.
Desta sujeira ele fez um kurgarra, uma criatura que não era nem macho, nem fêmea
Enki tirou um pouco de sujeira de sua outra unha.
Desta sujeira ele fez um galatur, uma criatura que não era nem macho, nem fêmea
Ele deu o alimento da vida ao kurgarra
Ele deu as águas da vida ao galatur
Enki falou ao kurgarra e ao galatur, dizendo:
- Vão ao Mundo Subterrâneo
Entrem pelos portais tal qual moscas
Ereshkigal, a Rainha do Mundo Subterrâneo, está gemendo
Com os gritos de uma mulher que está para dar à luz.
Nenhum lençol de linho cobre o corpo dela
Os seios de Ereshkigal estão descobertos
O cabelo de Ereshkigal parece-se com alho-poró
Quando ela gritar "Ah, como me dói tudo por dentro!"
Gritem também "Ah, como vos dói tudo por dentro!"
Quando ela gritar "Ah, como me dói tudo por fora!"
Gritem também "Ah, como vos dói tudo por fora!"
A Rainha vai ficar agradecida
E oferecer a vocês um presente
Peçam a ela apenas pelo cadáver de Inana que está dependurado num gancho da parede
Um de vocês irá dar a este cadáver o alimento da vida
O outro irá dar-lhe as águas da vida
Inana então irá se levantar.
 
O kurgarra e o galatur seguiram à risca as palavras de Enki.
Eles partiram para o Mundo Subterrâneo
Como moscas, eles deslizaram através das aberturas dos grandes portais
Eles entraram na sala do trono de Ereshkigal, a Rainha do Mundo Subterrâneo.
Nenhum lençol de linho cobria o corpo dela
Os seios de Ereshkigal estavam descobertos
O cabelo de Ereshkigal parecia-se com alho-poró
 
Ereshkigal estava gemendo:
- Ah! Ah! Por dentro tudo me dói!
 Eles gemeram:
- Ah! Ah! Por dentro tudo vos dói!
 Ela gemia:
- Ahhh, por fora tudo me dói!
 Eles gemeram:
- Ahhh, por fora tudo vos dói!
 Ela deixou escapar um lamento:
- Minha barriga!
 Eles deixaram escapar outro lamento:
- Ah, vossa barriga!
 Ela gemeu:
- Ah! Ah! Minhas costas!
 Eles gemeram:
- Ah! Ah! Vossas costas!
 Ela suspirou:
- Ah! Ah! Meu coração!
 Eles suspiraram:
- Ah! Ah! Vosso coração!
Ela suspirou:
- Ah! Ah! Meu fígado!
 Eles suspiraram:
- Ah! Ah! Vosso fígado!
 Ereshkigal parou
Ela olhou para eles
Ela perguntou:
- Quem são vocês...
Gemendo, murmurando, suspirando comigo?
Se vocês são deuses, eu os abençôo
Se vocês são mortais, eu dar-lhes-ei um presente.
Para vocês, irei dar o Dom das águas, o rio mais cheio.
 O kurgarra e o galatur responderam:
- Não queremos este presente.
 Ereshkigal disse:
- Dar-lhes-ei o Dom dos grãos, dos campos na colheita.
 O kurgarra e o galatur responderam:
- Não queremos este presente.
 Ereshkigal disse:
- Falem então! O que desejam?
Eles responderam:
- Desejamos apenas o cadáver pendurado no gancho da parede.
Ereshkigal disse:
- O cadáver pertence a Inana.
 Eles disseram:
- Se o cadáver pertence à nossa rainha
Se o cadáver pertence ao nosso rei,
É o que realmente queremos.
 
O cadáver foi dado a eles.
 
O kurgarra deu ao cadáver o alimento da vida,
O galatur deu ao cadáver as águas da vida.
Inana se levantou....
 
Inana estava prestes a ascender do Mundo Subterrâneo
Quando os Anunaki, os juízes do Mundo Subterrâneo, prenderam-na.
Eles disseram:
- Ninguém ascende do Mundo Subterrâneo sem uma marca
Se Inana deseja retornar do Mundo Subterrâneo,
Ela deve providenciar alguém em seu lugar.
 
À medida em que Inana ascendia do Mundo Subterrâneo,
Os galla, os demônios do Mundo Subterrâneo, não desgrudaram de seu lado
Os galla eram demônios que não conhecem alimentos ou bebidas
Que não comem oferendas quer em forma de alimentos ou líquidos
Que não aceitam presentes
Que não gostam de fazer amor
Que não têm crianças para beijar
Eles tiram a esposa dos braços do marido
Eles tiram o filho ou filha dos joelhos do pai
Eles roubam a noiva do seu futuro lar.
 
Os demônios não desgrudaram de Inana
Os gallas pequenos que acompanhavam Inana
Eram como juncos de pequenos cercados
Os gallas grandes que acompanhavam Inana
Eram como juncos de grandes cercados
 
Aquele que caminhava à frente de Inana não era um ministro,
Mas carregava um cetro
Aquele que caminhava atrás de Inana não era um guerreiro,
Mas carregava uma clava
 
Ninshubur, vestida em saco da aniagem sujo
Esperava fora dos portais do palácio
Quando ela viu Inana rodeada pelos galla
Ela atirou-se no chão, na poeira, aos pés de Inana.
 
Os galla disseram:
- Sigai em frente, Inana.
Levaremos Ninshubur em vosso lugar.
 
Inana gritou:
- Não! Ninshubur é meu constante apoio
Ela é minha primeira-ministra, minha sukkal, que me dá sábios conselhos
Ela é a minha guerreira que luta ao meu lado
Ela não esqueceu minhas palavras.
 
Ela começou lamento por mim junto às ruínas
Ela bateu o tambor por mim nos locais de assembléia
Ela fez um círculo completo ao redor da casa dos deuses
Ela fez os sinais de luto ao redor dos olhos, da boca, de seus quadris,
Ela vestiu-se com apenas uma peça de roupa, tal qual um mendigo
Sozinha, ela foi a Nippur, ao templo de Enlil.
Sozinha, ela foi a Ur, ao templo de Nana
Sozinha, ela foi a Eridu, ao templo de Enki.
Por causa dela, minha vida foi salva
Jamais darei Ninshubur a vocês.
 
Em Umma, no templo sagrado,
Shara, o filho de Inana, estava vestido com vestes sujas de saco de aniagem
Quando ele viu Inana rodeada pelos galla
Ele atirou-se no chão, na poeira, aos pés de Inana.
 
Os galla disseram:
- Sigai em frente, Inana.
Levaremos Shara em vosso lugar.
 
Inana gritou:
- Não! Não Shara!
Ele é o filho que canta hinos para mim
Ele é o filho que corta as minhas unhas e penteia meus cabelos
Jamais darei Shara a vocês!
 
Em Babtibira, no templo sagrado,
Lulal, o filho de Inana, estava vestido com vestes sujas de saco de aniagem
Quando ele viu Inana rodeada pelos galla
 
Os galla disseram:
- Sigai em frente, Inana, rumo à vossa cidade
Levaremos Lulal em vosso lugar.
 
Inana gritou:
- Não, não Lulal! Ele é meu filho
Ele é um líder entre os homens
Ele é meu braço direito, ele é meu braço esquerdo
Jamais darei Lulal a vocês!
Os galla disseram:
- Sigai em frente, Inana, rumo à vossa cidade
Iremos agora até a grande macieira de Uruk.
 
Em Uruk, junto à grande macieira,
Dumuzi, o esposo de Inana, estava vestido com suas cintilantes vestimentas das medidas sagradas
Ele estava sentado em seu magnífico trono (e de lá não se moveu)
 
Os galla pegaram-no pelos quadris
Os galla derramaram leite em Dumuzi proveniente de sete baldes
Eles quebraram a flauta de junco que o pastor estava tocando
 
Inana lançou a Dumuzi o olhar da morte
Ela falou contra ele uma palavra de ódio
Ela proferiu contra ele um clamor de culpa:
- Levem-no! Levem Dumuzi embora!
 
 Dumuzi deixou escapar um gemido
Ele levantou suas mãos para o céu, para Utu, o deus da Justiça, e suplicou a ele:
- Oh, Utu, tu és meu cunhado
Eu sou o esposo de tua irmã
Eu trouxe creme à casa de tua mãe
Eu trouxe leite para a casa de Ningal
Eu sou aquele que levou alimentos até o altar sagrado
Eu sou aquele que trouxe presentes de casamento a Uruk
Eu sou aquele que dançou nos joelhos sagrados, os joelhos de Inana.
Utu, tu que és um deus justo, um deus misericordioso
Transforma as minhas mãos nas mãos de uma serpente
Transforma meus pés nos pés de uma serpente
Deixe-me escapar de meus demônios
Não deixe eles me pegarem!
 
O misericordioso Utu aceitou as lágrimas de Dumuzi
Ele transformou as mãos nas mãos de uma serpente
Ele transformou os pés nos pés de uma serpente
Dumuzi escapou de seus demônios
Que não puderam prender Dumuzi.

A corte de Inanna e Dumuzi

O próximo texto do Ciclo de Inanna é a corte feita por Dumuzi a Inana.





O irmão falou para sua irmã mais jovem,
Utu, o deus Sol, falou a Inana, dizendo:
- Jovem senhora, o linho em flor é lindo,
Os grãos estão reluzentes nos campos.
Eu vou pegar alguns para você,
Eu vou trazer um pouco de linho para você.
Uma peça de linho é sempre bom de se Ter.
- Irmão, se você me trouxer o linho, quem irá fiá-lo para mim?
- Irmã, eu trá-lo-ei já fiado.
- Irmão, se você me trouxer o linho fiado, quem irá trançá-lo para mim?
- Irmã, eu trá-lo-ei fiado..
- Irmão, se você me trouxer o linho fiado, quem irá trançá-lo para mim?
- Irmã, eu trá-lo-ei trançado.
- Irmão, se você me trouxer o linho trançado, quem irá tecê-lo para mim?
- Irmã, eu trá-lo-ei tecido.
- Irmão, se você me trouxer o linho tecido, quem irá tingi-lo para mim?
- Irmã, eu trá-lo-ei tingido.
- Irmão, se você me trouxer meu lençol de noiva,
Quem irá para o leito comigo? Utu, quem irá para o leito comigo?
- Seu noivo irá para o leito com você.
Ele, que foi concebido no Casamento Sagrado. Dumuzi, o pastor!
Ele irá para o leito com você!
 Inana falou:
- Não, irmão! O homem do meu coração é aquele que trabalha os campos!
O agricultor! Ele é o homem do meu coração! Ele junta cereais em grandes pilhas,
Ele traz grãos regularmente para meus galpões.
  Utu falou:
- Irmã, case-se com o pastor! Por que não o queres?
O creme que ele faz é bom, o leite dele é bom.
O que ele toca, ele faz brilhar. Inana, case-se com Dumuzi!
Você, que se adorna com o colar de ágata da fertilidade,
Por que não o queres? Dumuzi irá compartilhar seu rico
creme com você. Você foi concebida para ser a protetora
do rei, por que não o queres?
  Inana respondeu:
- O pastor! Eu não me casarei com o pastor! Suas roupas são rústicas, a lã dele é dura. Eu vou me casar com o agricultor.
O agricultor cultiva o linho para minhas roupas. O agricultor planta cevada para minha mesa. Eu me casarei com o agricultor!
  Então Dumuzi apareceu e disse:
- Por que toda esta conversa sobre o agricultor?
Se ele der a você farinha, eu lhe darei lã,
Se ele der a você cerveja, eu lhe darei leite doce,
Se ele der a você pão, eu lhe darei o mais doce dos queijos.
Eu darei ao agricultor o creme que me sobrar.
Eu darei ao agricultor o leite que me sobrar.
Por que você fala [só] sobre o agricultor?
O que ele tem que eu não tenho?
  Inana disse:
- Pastor, se não fosse a minha mãe, Ningal, eu o mandaria embora.
Sem meu pai, Nana, você não teria teto sob sua cabeça.
Sem meu irmão Utu...
  Dumuzi falou:
- Inana, não comece uma briga! Meu pai, Enki, é tão bom quanto seu pai.
Minha mãe, Sirtur, é tão boa quanto sua mãe.
Minha irmã Geshtinana é tão boa quanto você,
Eu sou tão bom quanto seu irmão Utu. Rainha do Palácio, vamos conversar!
Inana, vamos sentar e conversar: eu sou tão bom quanto Utu,
Enki é tão bom quanto Nana, Sirtur é tão boa quanto Ningal.
Rainha do Palácio, vamos conversar!
As palavras que eles falaram foram palavras de desejo.
Do momento em que brigaram, surgiu de amantes o desejo.
O pastor trouxe creme para o palácio real
Dumuzi trouxe leite para o palácio real
Ele esperou do outro lado dos portais. Ele chamou:
- Abra a porta, minha senhora. Abra a porta da casa!
 Inana correu para a mãe que havia lhe dado à luz. Ela perguntou:
- O que devo fazer:?
  Ningal aconselhou-a, dizendo:
- Minha filha, o jovem Dumuzi irá tratá-la como se fosse seu pai.
Ele vai cuidar de você como se fosse sua mãe.
Abra a porta, minha filha, Abra a casa [para ele]!
 A pedido de sua mãe,
Inana se banhou e se ungiu com óleo perfumado
Ela cobriu seu corpo com o vestido branco real
Ela aprontou seu dote
Ela arrumou as preciosas contas de lápis lazuli ao redor de seu pescoço
Ela pegou seu selo sagrado.
 Dumuzi esperou (a) com ansiedade.
Inana abriu a porta para ele
Dentro da casa, ela brilhou diante dele
Como a luz da lua.
 Dumuzi olhou para ela alegremente
Ele aproximou seu pescoço do dela
Ele a beijou.
  Inana falou:
- O que eu te digo, que o cantor teça em canção
O que te digo, que passe do ouvido para a boca
Que passe do jovem para o ancião
Minha vulva, minha cornucópia
A Nau dos Céus
Está cheia de expectativa como a lua nova
Minha terra que não foi arada está desocupada
  E quanto a mim, Inana,
Quem irá arar a minha vulva?
Quem irá arar meu campo alto?
Quem irá arar meu solo úmido?
  E quanto a mim, a donzela,
Quem irá arar a minha vulva?
Quem irá deixar o gado ficar lá?
Quem irá arar minha vulva?
  Dumuzi respondeu:
- Grande Senhora, o rei irá arar sua vulva, eu, Dumuzi, o rei, irei arar sua vulva.
 Inana:
- Então are a minha vulva, homem do meu coração! Are a minha vulva!
No colo do rei ergueu-se o cedro
Plantas cresceram ao seu lado
Cereais cresceram ao lado das plantas e do cedro
Jardins floresceram da forma mais exuberante.
 Inana cantou:
- Ele desabrochou, ele desabrochou,
Ele é como alface plantada junto à água
Ele é aquele que meu útero mais adora.
  Meu luxuriante jardim da planície
Minha cevada crescendo alta nos campos
Minha macieira que traz frutos em sua coroa,
Ele é como alface plantada junto à água.
  Meu doce amor, meu doce amor sempre me enternece
Meu senhor, meu doce amor dentre os deuses
Ele é aquele que meu útero mais ama.
A mão de meu amor é mel, seu pé é de mel
Ele sempre me enternece.
  Meu impetuoso amor que acaricia o meu umbigo
Ele é aquele a quem meu útero mais ama
Ele é como alface plantada junto à água.
  Dumuzi cantou:
- Ah, senhora, teu seio é o teu campo
Inana, teu seio é teu campo
Teu campo amplo derrama plantas
Teu campo amplo derrama cereais
As águas circulam altas para teu servo
Derrama-a para mim, Inana,
Eu beberei tudo o que me ofereceres!
 
Inana cantou:
- Faz teu leite doce e espesso, meu noivo.
Meu pastor, eu beberei teu leite fresco.
Touro selvage, Dumuzi, faz teu leite doce e espesso
E eu beberei teu leite fresco.
 
Que o leite de cabra corra nos meus rebanhos
Encha meus baldes com queijo doce
Senhor Dumuzi, eu beberei teu leite fresco.
 
Meu esposo, eu guardarei os meus rebanhos para ti.
Eu irei zelar pela tua casa da vida, o armazém.
O local do brilho e prazer que faz as delícias da Suméria
A casa que dá o hálito da vida às pessoas
A casa que dá o pão da vida às pessoas
Eu, a rainha do palácio, zelarei pela tua casa!
 
Dumuzi falou:
- Minha irmã, eu gostaria de ir contigo ao meu jardim
Inana, eu gostaria de ir contigo ao meu jardim
Eu gostaria de ir contigo ao meu pomar
Eu gostaria de ir contigo até a minha macieira
E lá eu gostaria de plantar a doce semente coberta de mel.
 
Inana falou:
- Ele me levou ao seu jardim
Meu irmão, Dumuzi, me levou para seu jardim
Eu passeei com ele entre as árvores viçosas
Eu fiquei ao seu lado entre as árvores caídas
Junto à macieira, eu me ajoelhei, como de costume
 
Meu irmão veio até mim entoando uma canção
Ele apareceu dentre as folhas de álamo
Ele veio até mim no calor do meio dia
Ante meu senhor Dumuzi
Eu derramei plantas do meu útero
Eu coloquei plantas diante dele
Eu derramei grãos diante dele
Eu derramei grãos do meu útero.
 
Inana cantou:
- Ontem à noite, quando eu, a rainha estava radiante
Ontem à noite, quando eu, a Rainha dos Céus, estava radiante,
Quando eu estava radiante e dançando
Cantando à chegada da noite...
 
Ele foi ao meu encontro, ele foi ao meu encontro!
Meu senhor Dumuzi foi ao meu encontro!
Ele pôs sua mão na minha
Ele colocou seu pescoço junto ao meu.
 
Meu alto sacerdote está pronto para os quadris sagrados
Meu senhor Dumuzi está pronto para os quadris sagrados
As plantas e ervas estão maduras nos campos
Ah, Dumuzi, teu viço faz as minhas delícias!
 
Ela chamou pelo leito, ela chamou pelo leito, ela chamou pelo leito!
Ela chamou pelo leito que alegra o coração
Ela chamou pelo leito que adoça os quadris
Ela chamou pelo leito que faz reis
Ela chamou pelo leito que faz rainhas
Ela chamou pelo leito:
- Que o leito que alegra o coração seja preparado!
Que o leito que adoça os quadris seja preparado
Que o leito que faz reis seja preparado
Que o leito que faz rainhas seja preparado!
Que o leito real seja preparado!
  Inana estendeu o lençol de noivado por sobre o leito
Ela chamou pelo rei:
- O leito está pronto!
Ela chamou por seu noivo:
- Meu noivo, o leito está esperando!
Ele pôz a sua mão na mão dela
Ele pôz a sua mão no coração de Inana
Doce é o adormecer de mãos dadas
Mais doce ainda é o adormecer de corações se tocando.
Ela se banhou para o touro selvagem
Ela se banhou para o pastor Dumuzi
Ela perfumou sua pele com óleo
Ela molhou seus lábios com âmbar de doce perfume
Ela pintou seus olhos com kohl]
Ele esculpiu os quadris dela com suas doces mãos
O pastor Dumuzi encheu o colo de Inana com creme e leite
Ele acariciou os pêlos ´púbicos dela
Ele aguou o útero de Inana.
Com as mãos, ele tocou na vulva plena
Ele alisou a nau escura dela com seu creme
Ele tocou a nau estreita de Inana, enchendo-a com seu leite
Ele acariciou Inana no leito.
Então ela acariciou o alto sacerdote no leito
Inana acariciou o fiel pastor Dumuzi
Ela acariciou os quadris dele, a força do pastoreio da terra.
Ela decretou um doce destino para ele.
Inana, a Primogênita da Lua, a Rainha do Céu e da Terra,
A jovem e heróica mulher, maior que sua mãe
Inana, a quem foram dadas as Sagradas Medidas do Céu e da Terra por Enki,
O deus da Sabedoria, das Águas Doces e da Mágica,
Inana, a Rainha dos Céus, decretou o destino de Dumuzi:
- Na batalha, eu te lidero
No combate, seguro tua armadura
Na assembléia, sou tua advogada,
Na campanha, sou tua inspiração
Tu, o pastor escolhido do templo sagrado
Tu, o rei, o fiel provedor de Uruk
Tu, a luz do grande templo de Anu
De todas as formas te acho capaz
Para caminhar de cabeça erguida nos corredores elevados
Para sentar sentar no trono de lápis lázuli
Para cobrir tua cabeça com a coroa sagrada
Para vestir roupas longas no teu corpo
Para colocar os trajes da realeza
Para carregar a clava e a espada
Para guiar em linha reta o arco e a flecha
Para colocar a funda no ombro
Para correr na estrada com o cetro sagrado em tua mão
E usar as sandálias sagradas nos teus pés
Para brincar no seio sagrado como berloque de lápis lazuli.
Tu, o melhor corredor, o melhor de todos, o pastor escolhido,
De todas as formas eu te acho capaz
Que teu coração viva longos dias
O que Anu decretou para ti, que não seja alterado.
O que Enlil te concedeu - que não seja mudado.
Tu és o favorito de Ningal. E eu, Inana, te quero muito
 
Ninshubur, a serva fiel do templo sagrado de Uruk,
Levou Dumuzi até os doces quadris de Inana, e falou:
- Minha senhora, aqui está a escolha de vosso coração,
O rei, vosso amado noivo.
Que ele passe longos dias na doçura de vossos sagrados quadris.
Concedei, pois também a ele um reinado favorável e glorioso
Concedei-lhe o bastão de julgamento dos pastores
Concedei-lhe a coroa duradoura com o diadema nobre e radiante.
  De onde o sol surgir até onde o sol se por
De Sul a Norte, dos Mares Superiores aos Mares Inferiores
Da terra da Árvore de Hulupu à terra dos cedros
Que o bastão de pastor de vosso noivo proteja toda a Suméria e Acádia.
  Como agricultor, que ele faça os campos férteis
Como pastor, que ele faça os rebanhos se multiplicarem
Sob seu reinado, que hajam os campos vais viçosos
Sob seu reino que haja abundância de grãos.
  Nos campos do Sul, que os peixes e os pássaros se multipliquem
Nos canaviais que os juncos novos e velhos cresçam alto
Nas estepes, que as árvores mashgur cresçam viçosas,
Nas florestas, que o veado e as cabras selvagens se multipliquem
Nos pomares, que haja leite e vinho.
  Nos jardins, que as alfaces e os agriões cresçam alto
No palácio, que haja longa vida.
Que haja água para as cheias do Tigre e Eufrates
Que as plantas cresçam alto nos seus bancos e encham os campos
Que a Senhora da Vegetação empilhe grãos in montes e montanhas.
  Oh, minha Rainha do Céu e da Terra, Rainha de Todo Universo
Que ele passe longos dias na doçura de vossos sagrados quadris!
O rei foi de cabeça erguida até os quadris sagrados
Ele foi de cabeça erguida até os quadris de Inana
Ele foi até a rainha de cabeça erguida
Ele abriu bem os braços para a alta sacerdotisa dos céus.
 Inana falou:
- O rei foi de cabeça erguida até os quadris sagrados
Ele foi de cabeça erguida até os quadris de Inana
Ele foi até a rainha de cabeça erguida
Ele abriu bem os braços para a alta sacerdotisa dos céus.
Inana falou:
- Meu amor, a delícia dos meus olhos, me encontrou. Juntos, fomos felizes.
Ele foi feliz comigo. Ele me trouxe para sua casa.
Ele me deitou no leito perfumado de mel
Meu doce amor deitou-se junto ao meu coração
E me cobriu de beijos
Meu adorado Dumuzi fez amor comigo cinqüenta vezes
Agora, meu doce amor está saciado
Agora ele diz:
"Dê-me a liberdade, minha irmã, deixe-me livre
Você será como uma filhinha para meu pai
Ouça, minha irmã, eu quero sair do palácio
Deixe-me livre"...
Inana falou:
- Meu amor que desabrochou, teu encanto foi doce
Meu amor que desabrochou no pomar das maçãs
Meu amor que me trouxe frutos no pomar das maçãs
Dumuzi-abzu, teu encanto foi doce.
Meu destemido, minha estátua sagrada
Minha estátua com diadema de lápis lázuli e espada
Como foi doce o teu encanto...

domingo, 22 de janeiro de 2012

Inanna e Enki, ou a obtenção das Medidas Sagradas (ME)

Continuando o Ciclo de Inanna, o próximo texto se chama "Inanna e Enki, ou a obtenção das Medidas Sagradas". Nele é contado como Enki (a partir de uma trapaça) dá a sua Filha (no texto Ela é retratada como Filha de Enki - na verdade isso não é literal, o pai de Inanna é Nanna/Sinn). Inanna, assim toma todo o Conhecimento e o leva para a sua cidade Uruk, tornando-se a Deusa de Toda o Conhecimento e Sabedoria.



Inana colocou a shugurra, a coroa da estepe na cabeça 
Ela foi até os rebanhos de ovelhas, Ela foi até o pastor 
Ela se encostou contra a macieira. 
Quando Ela se encostou contra a macieira, sua vulva era algo lindo de se ver. 
Regozijando-se com sua vulva maravilhosa, a jovem se aplaudiu. Ela disse: 
- Eu, a Rainha dos Céus, irei visitar o Deus da Sabedoria. 
Eu irei ao Abzu, o local sagrado em Eridu. 
Em Eridu, eu prestarei homenagens a Enki, o deus da Sabedoria. 
Eu farei uma prece para Enki, o deus das doces águas. . 
  
Quando Ela estava a uma curta distância do Abzu, o local sagrado de Eridu, 
Ele, cujos ouvidos estão [sempre] abertos, 
Ele, que conhece os ME, as leis sagradas do céu e da terra, 
Ele, que conhece o coração dos deuses, 
Enki, o deus da Sabedoria, que tudo sabe, 
Chamou seu servo Isimud. 
  
- Ouça, meu sukkal, a jovem está prestes a entrar no Abzu 
Quando Inana entrar no altar sagrado 
Dê-lhe bolo amanteigado para Ela comer 
Dê-lhe água para refrescar suas orelhas 
Ofereça-lhe cerveja ante a estátua do leão 
Trate-a como uma igual 
Dê as boas-vindas a Inana na mesa sagrada, a mesa dos céus. 
  
Isimud prestou ciosamente atenção às palavras de Enki. 
Quando Inana entrou no Abzu 
Ele deu-lhe bolo amanteigado para comer 
Ele deu-lhe água para beber 
Ele ofereceu-lhe cerveja ante a estátua do leão 
Ele tratou-a respeitosamente 
Ele deu as boas-vindas a Inana à mesa sagrada dos céus.. 
  
Enki e Inana beberam cerveja juntos 
Eles beberam mais cerveja juntos. 
Eles beberam mais e mais cerveja juntos. 
Com as taças de bronze da Deusa Mãe Urash cheias até transbordar 
Eles brindaram um ao outro 
Eles desafiaram um ao outro. 
  
Enki, alto de cerveja, brindou Inana: 
- Em nome do meu poder! Em nome do meu altar sagrado! 
Para minha filha Inana, eu darei o Alto Sacerdócio! Divindade! 
A coroa nobre e duradoura! O trono da realeza! 
  
Inana replicou: - Eu os aceito! 
  
- Verdade! A descida para o Mundo Subterrâneo! Ascenção do Mundo Subterrâneo! 
A arte de fazer amor! O beijo do falo! 
  
Inana replicou: - Eu os aceito! 
  
Enki ergueu sua taça e brindou Inana pela terceira vez: 
Em nome do meu poder! Em nome do meu altar sagrado! 
- Para minha filha Inana eu darei o Alto Sacerdócio dos Céus! 
O poder de fazer lamentações! O regozijar dos corações! 
O poder de fazer julgamentos! O poder de tomar decisões! 
  
(14 vezes Enki ergueu sua taça à Inana 
14 vezes ele ofereceu à sua filha os MES 
14 vezes Inana aceitou os sagrados MEs) 
Então Inana, levantou-se ante a seu Pai, 
Reconhecendo os MEs que Enki havia-lhe dado: 
- Ele me deu o ME da coroa nobre e duradoura; 
Ele me deu o ME do trono da realeza; 
Ele me deu o ME do cetro da nobreza; 
Ele me deu o ME do bastão; 
Ele me deu o ME do cetro e da linha sagrados que tudo medem; 
Ele me deu o ME do trono elevado; 
Ele me deu o ME da liderança sobre os rebanhos; 
Ele me deu o ME da realeza; 
Ele me deu o ME da sacerdotisa princesa; 
Ele me deu o ME da divina sacerdotisa-rainha; 
Ele me deu o ME do sacerdote dos encantamentos; 
Ele me deu o ME do sacerdote nobre; 
Ele me deu o ME do sacerdote que faz oferendas de bebidas sagradas; 
Ele me deu o ME da verdade; 
Ele me deu o ME da descida ao Mundo Subterrâneo; 
Ele me deu o ME de ascenção do Mundo Subterrâneo; 
Ele me deu o ME da execução de rituais de luto; 
Ele me deu o ME da adaga e da espada; 
Ele me deu o ME da vestimenta escura; 
Ele me deu o ME das vestimentas claras; 
Ele me deu o ME da arte de fazer amor; 
Ele me deu o ME do beijar do falo; 
Ele me deu o ME da arte da velocidade; 
Ele me deu o ME da fala direta; 
Ele me deu o ME da fala traiçoeira; 
Ele me deu o ME do discurso enfeitado; 
Ele me deu o ME da taverna sagrada; 
Ele me deu o ME do altar sagrado; 
Ele me deu o ME da Sagrada Sacerdotisa dos Céus; 
Ele me deu o ME do retumbante instrumento musical; 
Ele me deu o ME da arte de fazer canções; 
Ele me deu o ME da arte de envelhecer; 
Ele me deu o ME da arte do poder; 
Ele me deu o ME da arte da traição; 
Ele me deu o ME da arte de ser direto; 
Ele me deu o ME da pilhagem das cidades 
Ele me deu o ME do fazer lamentações; 
Ele me deu o ME do regozijar dos corações; 
Ele me deu o ME do embuste; 
Ele me deu o ME da terra rebelde 
Ele me deu o ME da arte da bondade; 
Ele me deu o ME das viagens; 
Ele me deu o ME da morada segura; 
Ele me deu o ME da arte de trabalhar em madeira; 
Ele me deu o ME da arte de trabalhar com cobre; 
Ele me deu o ME da arte do escriba; 
Ele me deu o ME da arte do ferreiro; 
Ele me deu o ME da arte de trabalhar o couro; 
Ele me deu o ME da arte do construtor; 
Ele me deu o ME da arte de trabalhar com juncos; 
Ele me deu o ME do ouvido que tudo percebe; 
Ele me deu o ME do poder da atenção; 
Ele me deu o ME dos ritos sagrados de purificação; 
Ele me deu o ME da pena prodigiosa; 
Ele me deu o ME do empilhar de carvões quentes; 
Ele me deu o ME dos rebanhos de ovelhas; 
Ele me deu o ME do leão de dentes amargos; 
Ele me deu o ME do espanto; 
Ele me deu o ME da consternação; 
Ele me deu o ME do reavivar o fogo; 
Ele me deu o ME do braço fatigado; 
Ele me deu o ME da família reunida; 
Ele me deu o ME da procriação; 
Ele me deu o ME do atiçar das disputas; 
Ele me deu o ME do acalmar dos corações; 
Ele me deu o ME dos julgamentos, 
Ele me deu o ME de tomar decisões. 
  
Ainda alto com a bebida, Enki falou a seu servo Isimud: 
- Meu sukkal Isimud, a jovem senhora está prestes a partir para Uruk 
É meu desejo que ela chegue a sua cidade em segurança! 
Inana reuniu as Medidas Sagradas. Os ME foram colocados na Nau dos Céus. 
A Nau dos Céus com as Medidas Sagradas zarpou na direção de Uruk. 
  
Quando a cerveja tinha-se evaporado daquele que tinha bebido cerveja, 
Quando a cerveja tinha-se evaporado de pai Enki, 
Enki olhou ao seu redor, no Abzu. 
Os olhos do rei do Abzu buscaram por toda Eridu. 
O rei Enki olhou por toda Eridu e chamou seu servo Isimud, dizendo; 
- Meu ministro [sukkal] Isimud.... 
- Meu rei Enki, estou aqui para servi-vos... 
- O alto sacerdócio? Divindade? A coroa nobre e duradoura? 
Onde estão? 
- Meu rei deu-os todos para vossa filha, meu rei deu-os todos para Inana. 
- A arte do herói? A arte do poder:? Da traição? De enganar? 
Onde estão elas? 
- Meu rei deu-os todos para vossa filha. 
- O ouvido que tudo percebe, o poder da atenção, 
O poder para tomar decisões, onde estão eles? 
- Meu rei deu-os todos para vossa filha. 
  
(14 vezes Enki questionou seu servo Isimud. 14 vezes Isimud respondeu dizendo: 
- Meu rei deu-os todos para vossa filha, meu rei deu-os todos para Inana). 
  
Então Enki falou, dizendo: 
- Isimud, a Nau dos Céus com as Medidas Sagradas, onde está ela agora: 
- A Nau dos Céus está a um cais distante de Eridu. 
Vá! Leve as criaturas enku com você! Que elas tragam a Nau dos Céus de volta a Eridu! 
 Isimud falou a Inana: 
- Minha rainha, vosso pai mandou-me até vós. 
As palavras de vosso pai são palavras de Estado. 
Elas não podem ser desobedecidas. 
 Inana respondeu: 
- O que disse meu pai? O que Enki falou? 
Quais são as suas palavras de estado 
Que não podem ser desobedecidas? 
Isimud falou: 
- Meu rei disse: Que Inana prossiga até Uruk, 
Mas traga de volta a Nau dos Céus 
Com as Medidas Sagradas para Eridu. 
 Inana clamou: 
- Meu pai mudou a palavra que deu para mim! Ele violou seu juramento, quebrou sua promessa. Com falsidade ele falou alto e forte: Em nome do meu poder! Em nome do meu altar sagrado! 
Com falsidade ele mandou você até mim! 
  
Mal Inana havia pronunciado estas palavras, 
As criaturas enku pegaram a Nau dos Céus. 
Inana chamou sua serva Ninshubur, dizendo: 
- Vem, Ninshubur, outrora foi você Rainha do Leste. 
Agora, é você a serva fiel do altar sagrado de Uruk. 
Água não tocou seus pés, água não tocou suas mãos. 
Minha sukkal, ministra e conselheira que dispensa sábios conselhos, 
Minha guerreira que luta ao meu 
Salva a Nau dos Céus com as Medidas Sagradas! 
  
Ninshubur fez um gesto como se cortasse o ar com sua mão. 
Ela então soltou um grito de partir corações. 
  
As criaturas enku foram então mandadas de volta a Eridu! 
  
Então Enki. Chamou seu servo Isimud uma segunda, uma terceira, uma quarta, uma quinta e uma sexta vez, dizendo: 
- Meu ministro [sukkal] Isimud.... 
- Meu rei Enki, estou aqui para servi-vos... 
- Onde está a Nau dos Céus neste momento? 
De cada vez, Isimud dá seis diferentes localizações para a 
Nau dos Céus ao responder ao seu rei e senhor. 
De cada vez, Enki dá a mesma resposta a Isimud: 
- Então vá e mande monstros para capturar a Nau dos Céus! 
  
Isimud mandou os monstros 
Uma, duas, três, quatro, cinco, seis, sete vezes 
Para aprisionar a Nau dos Céus. 
De cada vez, mais fortes eram os monstros, mais poderosos. 
Mas uma, duas, três, quatro, cinco, seis e sete vezes 
Ninshubur resgatou a Nau dos Céus para Inana. 
  
Então Ninshubur falou a Inana: 
- Minha rainha, quando a Nau dos Céus entrar pelo Portal de Ningulla de Uruk 
Que as águas altas fluam para nossa cidade, 
Que os barcos maiores velejem rapidamente através de nossos canais! 
Inana respondeu a Ninshubur: 
- No dia em que a Nau dos Céus entrar pelo Portal de Ningulla de Uruk, 
Que as altas águas limpem todos os caminhos, 
Que os anciões dispensem conselhos, 
Que as anciãs ofereçam consolo aos corações! 
Que os jovens mostrem o poder de suas armas, 
Que as crianças riam e cantem, 
Que toda Uruk esteja em festa! 
Que o alto sacerdote dê as boas-vindas à Nau dos Céus com canções, 
e que e ele faça preces grandiosas! Que o rei 
ofereça gado e ovelhas em sacrifício, que ele os regue de cerveja! 
Que ressoem os tambores e tamborins, que doce música seja tocada! 
Que toda a terra proclame o meu nobre nome 
Que o meu povo me cante em canção! 
  
E assim foi feito. 
No dia em que a Nau dos Céus entrou pelo Portal de Ningulla de Uruk 
As águas altas varreram as ruas 
As águas altas fluíram pelos caminhos 
A Nau dos Céus aportou no altar sagrado de Uruk. 
A Nau dos Céus aportou no altar sagrado de Inana. 
  
Então Enki chamou seu servo Isimud pela última vez, dizendo: 
- Meu ministro [sukkal] Isimud...
- Meu rei Enki, estou aqui para servi-vos... 
- Onde se encontra agora a Nau dos Céus? 
- A Nau dos Céus está no Branco Cais. 
- Vamos! A senhora está fazendo maravilhas lá! 
A Rainha está fazendo maravilhas no Branco Cais 
Inana está fazendo maravilhas no Branco Cais 
Pois a Nau dos Céus está em Uruk! 
  
As Medidas Sagradas foram sendo descarregadas 
E à medida em que as Medidas Sagradas estavam sendo descarregadas 
As Medidas Sagradas que Inana havia recebido de Enki 
Elas foram sendo anunciadas e presenteadas ao povo da Suméria. 
Então mais MÊS apareceram 
Mais MÊS do que Enki havia dado a Inana. 
E estes também foram presenteados para o povo de Uruk. 
  
Inana trouxe as Medidas Sagradas 
Ela trouxe o colocar da roupa no chão 
Ela trouxe encanto 
Ela trouxe a arte de ser mulher 
Ela trouxe a perfeita execução dos ME 
Ela trouxe os tambores tigli e lili 
Ela trouxe os tamborins sagrados. 
  
Inana falou novamente: 
- Onde a Nau dos Céus aportou 
Que seja este local chamado o Branco Cais 
Onde foram apresentados os ME sagrados 
Que seja este local chamado o Cais de Lápis Lazuli. 
  
Então Enki falou a Inana, dizendo: 
- Em nome do meu poder! Em nome do meu altar sagrado! 
Que os ME que você conquistou permaneçam no altar sagrado de sua cidade! 
Que o alto sacerdote passe o seu dia entoando cantos no altar sagrado 
Que os cidadãos de tua cidade prosperem! 
Que os filhos de Uruk se regozijem! 
O povo de Uruk é aliado do povo de Eridu 
Que a cidade de Uruk seja restaurada em seu poder nesta grande terra! 

Fonte: Babilônia Brasil